Tenho excelentes recordações do tempo em casa. Brincava de Playmobil, Lego; inventava coisas com pedaços de madeira e plástico usando as ferramentas do meu pai. Quando ia para à casa da minha avó, tentava criar um extrato medicinal para ajudar no joanete dela. É verdade que eu depenava algumas plantas do jardim, mas até ela achava divertido. Também tinha as saídas com meu pai para pescar. Era muito legal vê-lo sempre conseguir enquanto eu só tinha peixes roubando minhas iscas. Tinha a hora de ver nossa série preferida: Jornada nas estrelas. Ficar em casa era uma excelente ideia. Não tinha cara de chatice ou mesmice. Era um privilégio curtir minha mãe e minhas irmãs depois da escola e meu pai depois do trabalho. Tínhamos problemas, claro! Mas eram vencidos por uma família que decidiu jamais abrir mão uns dos outros. 

À medida em que a vida pós-moderna avança em suas múltiplas agitações, os casais, os pais e os filhos convivem muito pouco e o ônus disso é grande. Pessoas que não se relacionam tornam-se estranhas. Pessoas estranhas constrangem-se com o ficar perto. Assim, progressivamente o ambiente de intimidade torna-se mais hostil que acolhedor. As coisas não acontecem de uma hora para outra. Se não houver uma intenção clara e prática de tornar a família um lugar de relacionamentos profundos e agradáveis, isso não vai acontecer. Relacionamentos são como sementes: só crescem se o ambiente for adubado e regado. 

Com a pandemia e a obrigatoriedade de ficar em casa, tivemos uma grande oportunidade. Pudemos repensar nossos estilos de vida e redefinir prioridades. Alguns casais puderam se olhar, se escutar e se perceber melhor. Alguns pais puderam passar mais tempo com os filhos e vice-versa. Será que essas oportunidades estão sendo aproveitadas?

O “home-office” de muitos e o desemprego de outros podem ter trazido novas demandas. É fato, entretanto, que a grande maioria passou a ter mais tempo em casa. Penso que uma cultura nova precisa ser estabelecida e isso dá trabalho. São necessárias mudanças na maneira de pensar e  adaptações na maneira de fazer. Isso passa pelo que definimos como importante na vida da gente. Se sua família é importante, transforme o “ficar em casa” em um novo estilo de vida do qual você não vai abrir mão. Transforme o tempo com a família em um tempo de amar, escutar, acolher,  divertir-se. Não deixe a casa ser um lugar onde cada um fica com seu celular em algum cômodo em vez de “se conectarem” uns com outros pelos olhos, pelos ouvidos e pelo toque. Para ajudar,  quero sugerir algumas atividades que podem promover essa realidade positiva do “ficar em casa”.

Segunda – TROCA-TROCA NA COZINHA. A cada segunda, um membro da família torna-se o chef a idealizar e fazer o jantar. Os outros tornam-se ajudantes. Isso vai treinar a paciência, o serviço mútuo além de ser muito divertido! Claro que em relação aos menores, eles podem ser os chefs, mas o realizar precisa ser combinado, considerando a idade e os riscos da tarefa. Algum adulto vai precisar assumir com o menor. 

Terça – O DONO DA BRINCADEIRA. A cada terça à noite um membro da família escolhe a brincadeira em que todos participarão. Essa pessoa tem a tarefa de escolher e conduzir a brincadeira. Todos, entretanto, devem participar com alegria. Isso vai ajudar a fortalecer a gentileza, a honra e a alteridade na família. 

Quarta – CONVERSA FRANCA. Depois do jantar todos conversarão sobre como está sendo a semana. Perguntas para orientar o diálogo: O que o alegrou e o entristeceu nesta semana? No final todos se abraçam e entregam palavras de encorajamento. Isso vai treinar a escuta e a empatia na família.

Quinta – NOITE DO TABULEIRO (ou afins). Depois do jantar, todos brincarão de um jogo de tabuleiro ou similar: Imagem e Ação, Banco Imobiliário, Uno, Jenga… Isso facilitará a comunicação divertida e aliviará o excessivo uso de telas. 

Sexta – CINEMA EM CASA. Depois do jantar, a família verá um filme em que todos possam assistir e depois poderão conversar sobre o que foi legal ou chato no filme escolhido. Isso vai ajudar os membros da família a julgarem ao que assistem, a fim de guardarem melhor suas mentes e corações. Os filmes podem provocar boas conversas sobre as influências que deixamos ou não fazerem parte de nós. 

Sábado – CONVERSA DOCE. A família sentada em roda escolhe um tema para todos compartilharem. À medida em que cada um fala ganha um bombom ou outra comidinha agradável que a família curte. Por exemplo. Hoje é dia de gratidão. Todos falam pelo que são gratos. Todos escutam quem está falando e agradecem juntos. Outro sábado: hoje é dia de perdão. Todos têm oportunidade de pedir perdão por algo e assim que um fala todos o abraçam. Hoje é dia de sabedoria. Cada um diz o que pensa sobre esse tema e, no final, o pai poderá trazer um ensino sobre isso e todos concordarão em buscar serem mais sábios. Cada sábado um valor, uma virtude ou uma boa atitude pode ser o tema da “conversa doce”.

Domingo – HORA DO PLANEJAMENTO. No domingo à noite todos se reúnem para planejar a semana. Nesse momento,  define-se quem vai ser o chef de cozinha na segunda, quem vai guiar a brincadeira na terça etc. Também é o momento de todos montarem suas agendas. Muitas coisas boas não acontecem nas famílias pela falta de organização do tempo. Se já começarmos a semana com uma agenda planejada, poderemos nos surpreender com a fluência das atividades. 

Desejo que essas dicas inspirem, mas com o passar do tempo, com certeza a própria família terá ideias muito legais e poderá até compartilhar com outros. Escreva para nós e conte o que achou desse texto. Se tiver alguma boa ideia para repartir com outras famílias, mande-a também! Será muito joia nos ajudarmos mutuamente. 

 

Tony Felicio

Conselheiro Escolar

tony.felicio@escolacrista.net.br